sábado, 20 de agosto de 2016

8 | It is what it is.

Tenho pássaros (sentados) na alma, mas sobretudo flores selvagens.
Onde outrora havia asas, há agora folhas a crescer descontroladamente, raízes a brotar da ponta dos dedos, estendendo-se preguiçosamente ao redor de mim, fazendo por me lembrar que mesmo não pertencendo com a facilidade das flores de vaso, o meu nome já não é partir. 
Sinto-me a crescer numa brecha de cimento, esticando os braços finos e verdes pela calçada, com a timidez de quem se atreve a desafiar aquilo que acreditou ser. Há qualquer coisa de emocionante na possibilidade de crescer junto à estrada: como se gritasse ao caminho que por agora não pretendo cruzá-lo, apenas contemplá-lo com a certeza de que um dia irá ser dia para o percorrer. (ou noite, já que todo o mundo sabe que as flores selvagens só viajam ao luar.) 
Reconheço, sem grandes tristezas, que não hei de ter nunca a qualidade de pertencer (pertençabilidade?!) de uma rosa vermelha, dessas que só de olhar para elas já se sabe que estão onde devem estar. Enquanto flor, sou pequena e tosca como um dente-de-leão, quase-invisível, quase-inexistente, tão leve que uma rajada de vento me poderia levar consigo no bolso. (sempre quis andar no bolso do vento, junto aos chapéus e guarda-chuvas perdidos). 
E hei de ir, um dia, pela estrada que agora me serve de hospedaria, à boleia do vento ou de alguém que me queira para marcar um livro; mas para já estou bem aqui, a passar despercebida na minha forma tímida de ser flor, à minha maneira ainda crua de saber ficar, apreciando (ainda com desdém) a dádiva de criar raízes. 

It is what it is. 

Mary Jane.

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