sábado, 20 de agosto de 2016

34 | Ode às raízes

Quantas vezes mais,
amor,
olharemos as árvores de dentro de casa?

Não há nada de curioso nelas,
as raízes nascem dentro de portas,
não fora das janelas.

Quantas vezes mais,
amor,
o tapete fará de jardim?

Que há de útil nas ervas,
perguntas,
para que as estimes assim?
não há em mim e na minha afeição
mais perfeição do que num pé de jasmim?

Quantas vezes mais,
amor,
a lâmpada tomará o lugar do sol?

Não é bela a ciência oculta da eletricidade, criança?

(esperança? disseste?

não, não, criança, disse eu.

desculpa, erro meu.)

Quantas vezes mais,
amor,
quantas vezes mais,
a chuva baterá no vidro e não nos cabelos?

Que há na chuva senão água?
não pode também ela sair da torneira?

E dos olhos, de que maneira.
devia oferecer-te uma flor.

Para que quero eu uma flor?
para que servem sequer as flores?
quero antes uma casa com dois aquecedores,
e filhos pequenos
para apertar atacadores.
uma casa pequenina, sabes?
para viver com os meus amores.

Pequenina?!
e espaço para as minhas dores?
onde deitarei a minha alma chorosa?
haverá sequer espaço para plantar uma rosa?
ai rapaz!
as raízes são para a terra,
não para mim.
eu sou assim.
tente perceber,
tente.
não sou boa a cuidar de plantas,
nem tão pouco de gente.

Quantas vezes mais?

não mais, amor, não mais.

Emily Words

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