sábado, 20 de agosto de 2016

25 | Des-saudade

O que fazer com a falta que não me fazes? 
Não é justo que a saudade vá embora quando há lugar para ela à mesa. 
Tenho no sótão da minha alma caixas de cartão a abarrotar de afeição oferecida, 
mas quando abro a carteira para oferecer amor
há só trevos secos e uma libra. 
Não sei lidar com a Des-Saudade, 
não sei o que fazer com a ausência-de-temer-ausência, 
não sei onde arrumar o meu desinteresse pelo meu interesse em ti.

Houve tempos em que o que sentia por ti tinha direito a moldura no centro da sala. 
Mas não mais. 
A questão não é teres partido - hipoteticamente: 
quantos não são os que (se) partem e e ficam por inteiro. 
A questão é teres levado contigo a saudade que deveria ter ficado. 

Eu não sei não sentir saudade.

Momento sincero: 
Eu.
Estou-me.
Nas.
Tintas.
Para.
Ti. 

E o que fazer com essas tintas que nem para pintar paredes servem? 
És um filho da mãe egoísta. 
As pessoas normais vão embora e despedaçam o coração de quem fica, 
deixam-lhe saudades espalhadas pela casa, 
esquecem pacotes de "fazes-me falta" no frigorífico da cozinha.


Mas tu, seu catraio insuportável, não só bateste a porta como levaste contigo a falta que me deverias fazer. 
Agora eu não sinto nada.
Como sempre. 
Nada. Nadinha. Nicles. Nothing. Niente. 
Ora, Porra. 
Eu quero a saudade a que tenho direito. 
EU EXIJO SENTIR ALGO. 

Que seja saudade. 
Que seja falta. 
Que seja Algo.

E que seja rápido. 

Ninguém não-sente saudade assim que um não-amor (não) vai embora.

O que fazer com a ausência de sentir? 
Tenho blocos de indiferença a barrar-me a entrada da dispensa da alma. 

Na minha mente nunca é dia de limpeza.
P'ra quê arrumar se no dia seguinte está suja de novo? 
Na minha mente nunca se faz a cama. 
Porque a minha mente nem tem cama: ao contrário do meu corpo, que parece nunca acordar, 
a minha mente nunca dorme. 

Haverá "Dormidina" para as almas que não dormem? 


A questão é que ao ires embora 
(e quando falo na tua partida é uma partida simbólica, não corpórea) 
deixaste cá (dentro) as tuas tralhas.
Agora,
além das minhas caixas de indiferença, 
e das minhas pilhas de "sentir-falta-de-sentir-falta", 
tenho ainda as tuas latas de carinho, as tuas caixas de amor, as tuas sacas de preocupação...
tudo aquilo para o qual 

I don't give a shit.

E que não sei onde guardar. 
Não é irónico? 
Não é irónico ter caixotes de amor até vir o chico e não poder oferecer-tos? 

Quem me dera que: 
...eu pudesse dar-te tantas caixas de amor como tu a mim.
... as minhas arcas de frieza não me barrassem a passagem para o quarto onde dorme o meu sentimento por ti. 
Dorme? 
Devia ir ver se ainda respira.
Mas nem consigo passar.
...que fosse eu em vez do Gil T.Sousa a inventar a frase "tenho pássaros nos olhos".


A culpa é minha. 
Sou uma acumuladora de emoções desprezíveis.
(e uma obsessiva compulsiva das limpezas sentimentais)
Guardo lixo e lanço fora tesouros.

Talvez tenha sido eu mesma a pôr-te porta fora. 
Mas a minha alma 
(ou o meu coração)
nem porta tem.

Quem quiser que entre pela janela.

Tu partiste. 
Hipoteticamente.
E eu não sinto falta. 
Eu não sei não sentir falta.

EU EXIJO QUE ME DEVOLVAM A MINHA CAPACIDADE DE SENTIR SAUDADE.
Já.

Para poupar nos portes, mandem no mesmo envelope a minha capacidade de sentir vontade de estudar.


FIM.

Uma espécie de coisa que parece um poema de,
Madeline.

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